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sexta-feira, 28 de dezembro de 2012


Reencarnação – Transmigração Progressiva

Questões 189 a 196 de O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec

Cap. XI, 33 A 49, de A Gênese, de Allan Kardec

Cap. IV, de O Evangelho Segundo o Espiritismo, de Allan Kardec

 

Sendo o Espírito criado simples e ignorante, aos poucos vai percorrendo os caminhos de sua evolução. Pouco a pouco  desenvolve sua inteligência. Ninguém pode tornar-se Espírito puro em apenas algumas  encarnações. Necessitamos de milhares de encarnações para atingirmos a perfeição. Somente após várias encarnações ou depurações sucessivas, num tempo mais ou menos longo, e de acordo com seus esforços, que os Espíritos atingem o objetivo a que estão destinados. Mas, a perfeição da Terra, por exemplo, é relativa, não é a perfeição absoluta. Em cada planeta atingimos a perfeição que o mesmo comporta. Como disseram os Espíritos Superiores a Kardec, “o Espírito deve avançar em ciência e em moralidade”.

Explica Kardec que “a marcha dos Espíritos é progressiva, jamais retrógrada. Eles se elevam gradualmente na hierarquia e não descem da categoria que já alcançaram. Nas diferentes existências corporais podem descer como homens, mas não como Espíritos. Assim, a alma de um potentado da Terra pode, mais tarde, animar o mais modesto artesão e vice-versa, porque as posições entre os homens, frequentemente, estão na razão inversa da elevação dos sentimentos morais. Herodes era rei, Jesus, carpinteiro”.

Diz-nos Kardec que “o princípio da reencarnação é uma consequência necessária da lei de progresso. Sem a reencarnação, como se explicaria a diferença que existe entre o presente estado social e o dos tempos de barbárie? Se as almas são criadas ao mesmo tempo que os corpos, as que nascem hoje são tão novas, tão primitivas, quanto as que viviam há mil anos; acrescentemos que nenhuma conexão haveria entre elas, nenhuma relação necessária; seriam de todo estranhas umas às outras. Por que, então, as de hoje haviam de ser melhor dotadas por Deus, do que as que as precederam? Por que têm aquelas melhor compreensão? Por que possuem instintos mais apurados, costumes mais brandos? Por que têm a intuição de certas coisas, sem as haverem aprendido? Duvidamos de que alguém saia desses dilemas, a menos que admita que Deus cria almas de diversas qualidades, de acordo com os tempos e lugares, proposição inconciliável com a ideia de uma justiça soberana. Admiti, ao contrário, que as almas de agora já viveram, em tempos distantes; que possivelmente foram bárbaras como os séculos em que estiveram no mundo, mas que progrediram; que para cada nova existência trazem o que adquiriram nas existências precedentes; que, por conseguinte, as dos tempos civilizados não são almas criadas mais perfeitas, porém, que se aperfeiçoaram por si mesmas com o tempo, e tereis a única explicação plausível da causa do progresso social. Tudo na criação tem uma finalidade, sem o que Deus não seria nem prudente, nem sábio. Ora, se a Terra se destinasse a ser uma única etapa do progresso para cada indivíduo, que utilidade haveria, para os Espíritos das crianças que morrem em tenra idade, vir passar aí  alguns anos, alguns meses, algumas horas, durante as quais nada podem haurir dele? O mesmo ocorre se pondere com referência aos idiotas e aos cretinos. Uma teoria somente é boa sob a condição de resolver todas as questões a que diz respeito. A questão das mortes prematuras há sido uma pedra de tropeço para todas as doutrinas, exceto para a Doutrina Espírita, que a resolveu de maneira racional e completa. Para o progresso daqueles que cumprem na Terra uma missão normal, há vantagem real em volverem ao mesmo meio para aí continuarem o que deixaram inacabado, muitas vezes na mesma família ou em contato com as mesmas pessoas, a fim de repararem o mal que tenham feito, ou de sofrerem a pena de talião”.

No encontro de Jesus com o senador Nicodemos, há dois mil anos, quando este o procurou certa noite para dizer-lhe que ele, o Cristo, só poderia vir da parte de Deus para fazer aquelas coisas extraordinárias, tendo recebido como resposta que “é necessário nascer de novo para conhecer o Reino de Deus”, ao que Nicodemos teve dificuldades de entender, obrigando Jesus a dizer-lhe que ele era mestre em Israel e não sabia daquelas coisas, que são terrestres, imagina se ele falasse das coisas do céu... Mais claro é impossível. Jesus explica-lhe que o corpo nasce do corpo, mas o Espírito  vem do Espaço, ou seja, do Mundo Espiritual. O ensino de Jesus é muito claro, porém, clérigos e teólogos conseguiram deturpá-lo ao longo dos séculos, atribuindo ao batismo o poder mágico de transformar as pessoas, além de outras invencionices que a razão não admite, como a bobagem de que todos nascem com pecado... É uma longa estória, com tanta fantasia, que nem as crianças de hoje acreditam.

Há uma sabedoria muito sutil e profunda no mecanismo da reencarnação

Ensina Hermínio de Miranda que “o esquecimento é necessário ao progresso do Espírito, que só evolui quando caminha por suas próprias forças, escolhendo livremente entre o bem e o mal. De que lhe serviria uma existência  anterior, dos crimes que praticou, dos ódios que se abrigaram em seu coração, dos inimigos que teve, das riquezas ou poderes que possuiu, ou das misérias e angústias por que passou? Para que trazer, para uma existência que começa de novo, as aflições e preocupações de uma que se foi e já mergulhou no passado? Não é mais fácil nos reconciliarmos com uma criatura que não mais desperta em nós lembrança do dano que nos causou? As vidas que se entrelaçam estão cheias de exemplos dessa natureza. Numa existência, matamos um desafeto e lhe roubamos a esposa e os bens, encharcando de ódio a nossa vida e a dele. Os nossos caminhos se separam antes que pudéssemos refazer a amizade, mas ainda não  é tarde. É bem possível que ele nos volte, numa vida subsequente, como filho de nossa própria carne, para que lhe possamos restituir o bem da vida que lhe tiramos da outra vez e os bens materiais que dele subtraímos impiedosamente. É um processo inteligente e suave, pois que aquilo que lhe arrebatamos num instante, assumindo uma dívida enorme, agora lhe pagamos aos pouquinhos, sem grandes sacrifícios, amparando-o, educando-o à nossa custa, orientando-o para o bem. Quando, depois do desenlace de mais uma existência, nos reencontramos no Além, em plena consciência do passado, já estaremos reconciliados e mais amigos que nunca, pois nada é mais forte para cimentar uma ligação fraterna que a lembrança de antiga e superada inimizade. Se, porém, no decorrer da existência corpórea, identificássemos o antigo desafeto de passadas eras, não teríamos a mesma serenidade para concertar com ele um pacto de paz e harmonia, porque antigas feridas voltariam a sangrar e os sepultados ódios subiriam à tona, toldando-nos o entendimento e os bons propósitos. Além de tudo isso, há também razões de ordem prática e menos transcendentais. Não podemos trazer para uma nova existência antigos preconceitos, impertinências, intolerâncias, nem sequer o mesmo conservadorismo estreito que impediria o nosso progresso e nos tornaria velhos rabugentos desde a primeira infância. É que tudo evolui e progride, e, ao cabo de alguns decênios, precisamos mesmo ceder lugar aos Espíritos que vão chegando, para que, com a nossa caturrice muito natural da velhice, não comecemos a servir de estorvo a novas ideias e novas conquistas. Os próprios costumes sociais e políticos também mudam com os tempos, enquanto que nós, presos aos limitados horizontes de uma existência carnal, não podemos alcançar muito longe nem acompanhar a marcha das modificações históricas e sociais. Com todos os seus erros, desvios e desvirtuamentos, temos que reconhecer que vive hoje no mundo uma população materialmente mais sadia e mais ciosa da sua liberdade”.

 

segunda-feira, 12 de novembro de 2012


Bem-aventurados os que têm Puro o Coração

Cap. VIII, de O Evangelho Segundo o Espiritismo, de Allan Kardec

Simplicidade e Pureza de Coração

Bem-aventurados os que têm puro o coração, porquanto verão a Deus. (Mateus, 5;8)

Apresentaram-lhe então algumas crianças, a fim de que ele as tocasse, e, como seus discípulos afastassem com palavras ásperas os que lhas apresentavam, Jesus, vendo isso, zangou-se e lhes disse: Deixai que venham a mim as criancinhas e não as impeçais, porquanto o reino dos céus é para os que se lhes assemelham. Digo-vos, em verdade, que aquele que não receber o reino de Deus como uma criança, nele não entrará. E, depois de as abraçar, abençoou-as, impondo-lhes as mãos. (Marcos, 10:13-16)

Pecado por Pensamentos – Adultério

Aprendestes que foi dito aos antigos: Não cometereis adultério. Eu, porém, vos digo que aquele que houver olhado uma mulher com mau desejo para com ela, já em seu coração cometeu adultério com ela. (Mateus, 5:27-28)

Verdadeira Pureza – Mãos Não Lavadas

Então os escribas e os fariseus, que tinham vindo de Jerusalém, aproximaram-se de Jesus e lhe disseram: Por que  violam os teus discípulos a tradição dos antigos, uma vez que não lavam as mãos quando fazem as refeições? Jesus lhes respondeu: Por que violais vós outros os mandamentos de Deus, para seguir a vossa tradição? Porque Deus põs este mandamento: honrai a vosso pai e a vossa mãe; e este outro: seja punido de morte aquele que disser a seu pai ou a sua mãe palavras ultrajantes; e vós outros, no entanto, dizeis: aquele que haja dito a seu pai ou a sua mãe: Toda oferenda que faço a Deus vos é proveitosa, satisfaz à lei, ainda que depois não honre, nem assista a seu pai ou a sua mãe. Tornam, assim, inútil o mandamento de Deus, pela vossa tradição. Hipócritas, bem profetizou de vós Isaías, quando disse: Este povo me honra com os lábios, mas conserva longe de mim o coração; é em vão que me honram ensinando máximas e ordenações humanas. Depois, tendo chamado o povo, disse: Escutai e compreendei bem isto: Não é o que entra na boca que macula o homem; o que sai da boca do homem é o que macula. O que sai da boca procede do coração e é o que torna impuro o homem; porquanto do coração é que partem os maus pensamentos, os assassínios, os adultérios, as fornicações, os latrocínios, os falsos-testemunhos, as blasfêmias e as maledicências. Essas são as coisas que tornam impuro o homem; o comer sem haver lavado as mãos não é o que o torna impuro. (Mateus,15:1-20)

Enquanto ele falava, um fariseu lhe pediu para que fosse jantar em sua companhia. Jesus foi e sentou-se à mesa. O fariseu entrou então a dizer consigo mesmo: Por que não lavou as mãos antes de jantar? Disse-lhe, porém, o Senhor: Vós outros, fariseus, pondes grande cuidado em limpar o exterior do copo e do prato; entretanto, o interior dos vossos corações está cheio de rapinas e de iniquidades. Insensatos que sois! Aquele que fez o exterior não é o que faz também o interior? (Lucas, 11:37-40)

Conforme o ensino de Jesus, todos temos um encontro marcado com Deus. A condição para podermos adentrar o gabinete do Ser Supremo é sermos puros ou limpos. Até hoje, aqui na Terra, ninguém viu, falou ou visitou Deus porque não existe ninguém puro neste planeta do Sistema Solar. Os seres que se manifestaram para todos os profetas, dentre eles Moisés e todas as pessoas que tiveram e têm contato com seres espirituais aqui na Terra  e no Espaço, viram, falaram e receberam orientações de Espíritos encarregados de transmitir as ordens de Deus. Para nós, que ainda somos muito pequenos em espiritualidade, qualquer Espírito um pouquinho mais iluminado do que nós é um anjo ou o próprio Criador.

Somente um Espírito Puro, da Comunidade dos Espíritos Puros que aqui pisou e encarnou, vê e fala com Deus. Chama-se Jesus.

Ele resolveu vir pessoalmente trazer a Segunda Revelação para a Humanidade terrestre.  Hoje sabemos o porquê de as pessoas não terem entendido a afirmativa do Cristo  de que “os puros ou limpos um dia verão a Deus”. Tanto é assim que muitos vivem a dizer que falaram com Deus, que Deus disse-lhes isto ou aquilo, ou ainda pior, que foram enviados por Ele.

Como as religiões também não entenderam as ideias de Jesus, passam para seus profitentes  a ideia de que basta cumprirem com alguns rituais e contribuírem com tantos dinheiros para suas igrejas, que irão direto para a “Mansão do Senhor” no Paraíso, ou devem aguardar dormindo o dia do Juízo Final.  Mas, quando estas mesmas pessoas penetram o Mundo Espiritual, ficam perdidas, pois não encontram o endereço da Casa de Deus. São cegos guiando cegos. E todos sabemos o resultado disso. Por que?

Simplesmente porque foram mal orientadas ou não se deram ao trabalho de raciocinar sobre o sentido das palavras de Jesus. Falta-lhes a chave para a compreensão do que é o Espírito.

A Terceira Revelação, anunciada pelo próprio Cristo, foi feita para esclarecer todos os seres que habitam este planeta, corpóreos e incorpóreos, dando continuidade aos ensinos anteriores de Jesus. Com a Doutrina Espírita, tudo muda. Aprendemos a sentir os textos. Com a ajuda dos Espíritos Superiores, incluindo Kardec, tomamos conhecimento de que somos Espíritos em evolução. Aos poucos vamos adquirindo a pureza necessária para compreendermos tudo o que nos cerca no Universo, tudo o que nos diz respeito como seres criados para sempre. Desse modo, trabalhando por milhares de anos em nosso  burilamento, no Mundo Espiritual e reencarnando na Terra  e em outros planetas, atingiremos uma tal condição de pureza que poderemos, aí sim, vermos e falarmos com o Pai Celeste. Nesse dia, que ainda está um pouco longe, pois a evolução exige tempo e experiências, estaremos realmente ao lado de Jesus e poderemos ver o Pai de Amor Infinito.

Allan Kardec, primeiramente, ensina que “a pureza do coração é inseparável da simplicidade e da humildade. Exclui toda a ideia de egoísmo e de orgulho. Por isso é que Jesus toma a infância como emblema dessa pureza, do mesmo modo que a tomou como o da humildade. Poderia parecer menos justa essa comparação, considerando-se que o Espírito da criança pode ser muito antigo e que traz, renascendo para a vida corporal, as imperfeições de que se não tenha despojado em suas precedentes existências. Só um Espírito que houvesse chegado à perfeição nos poderia oferecer o tipo da verdadeira pureza. É exata a comparação, do ponto de vista da vida presente, porquanto a criancinha, não havendo podido ainda manifestar nenhuma tendência perversa, nos apresenta a imagem da inocência e da candura. Daí o não dizer Jesus, de modo absoluto, que o reino dos céus é para elas, mas para os que se lhes assemelhem “.

Pois que o Espírito da criança já viveu, por que não se mostra, desde o nascimento, tal qual é? Tudo é sábio nas obras de Deus. A criança  necessita de cuidados especiais, que somente a ternura materna lhe pode dispensar, ternura que se acresce da fraqueza e da ingenuidade da criança. Para uma mãe, seu filho é sempre um anjo e assim era preciso que fosse, para lhe cativar a solicitude. Ela não houvera podido ter-lhe o mesmo devotamento, se, em vez da graça ingênua, deparasse nele, sob os traços infantis, um caráter viril e as ideias de um adulto e, ainda menos, se lhe viesse a conhecer o passado.

O Espírito, pois, enverga temporariamente a túnica da inocência e, assim, Jesus está com a verdade, quando, sem embargo da anterioridade da alma, toma a criança por símbolo da pureza e da simplicidade.

Diz-nos, ainda, Allan Kardec que “a palavra adultério não deve absolutamente ser entendida aqui no sentido exclusivo da acepção que lhe é própria, porém, num sentido mais geral. Muitas vezes Jesus a empregou por extensão, para designar o mal, o pecado, tudo e qualquer pensamento mau, como, por exemplo,  nesta passagem: “Porquanto se alguém se envergonhar de mim e das minhas palavras, dentre esta raça adúltera e pecadora, o Filho do homem também se envergonhará dele, quando vier acompanhado dos santos anjos, na glória de seu Pai”. (Marcos, 8:38) A verdadeira pureza não está somente nos atos; está também no pensamento, porquanto aquele que tem puro o coração, nem sequer pensa no mal. Foi o que Jesus quis dizer; ele condena o pecado, mesmo em pensamento, porque é sinal de impureza. Esse princípio suscita naturalmente a seguinte questão: Sofrem-se as consequências  de um pensamento mau, embora nenhum efeito produza?

Cumpre se faça aqui uma importante distinção. À medida que avança na vida espiritual, a alma que enveredou pelo mau caminho se esclarece e despoja pouco a pouco de suas imperfeições, conforme a maior ou menor boa vontade que demonstre, em virtude do seu livre-arbítrio. Todo pensamento  mau resulta, pois, da imperfeição da alma; mas, de acordo com o desejo que alimenta de depurar-se, mesmo esse mau pensamento se lhe torna uma ocasião de adiantar-se, porque ela  o repele com energia. É um indicio de esforço por apagar uma mancha. Não cederá, se se apresentar oportunidade de satisfazer a um mau desejo. Depois que haja resistido, sentir-se-á mais forte e contente com a sua vitória. Aquela que, ao contrário, não tomou boas resoluções, procura ocasião de praticar o mau ato e, se não o leva a efeito, não é por virtude da sua vontade, mas por falta de ensejo. É, pois, tão culpada quanto o seria se o cometesse.

Em resumo, naquele que nem sequer concebe a ideia do mal, já há progresso realizado; naquele a quem essa ideia acode, mas a repele, há progresso em vias de realizar-se; naquele, finalmente, que pensa no mal e nesse pensamento se compraz, o mal ainda existe na plenitude da sua força. Num, o trabalho está feito; no outro, está por fazer-se. Deus, que é justo, leva em conta todas essas gradações na responsabilidade dos atos e dos pensamentos do homem”.

O Espírito Públio, ao comentar este capítulo, assim se expressa: “Estrutura cruel porque baseada na insinceridade, as igrejas de todos os credos estão cheias de bandidos fantasiados de adeptos fiéis, à espera da absolvição ou da bênção para que sigam furtando o semelhante, roubando o povo, comprometendo o progresso das comunidades no rumo da própria elevação. Longe de ser o tribunal puro da consciência, os diversos altares do mundo da crença se transformaram em balcões onde negociatas se realizam entre os representantes da fé e os interessados em seu financiamento, pagando, a peso de ouro, a absolvição da própria consciência, como se isso pudesse vir de fora para dentro. Daí porque Jesus combate tanto as noções de um mundo mentiroso, perante o qual as convenções e os interesses são capazes de modificar os princípios milenares de Justiça e Honradez. E, dessa maneira, alertou para a ocorrência daquilo que se convencionara chamar de “escândalo”, como sendo a conduta incompatível com os princípios elevados e que, acomodada sob o tapete das convenções e dos interesses, vez por outra aflora com seu fétido odor e suas características purulentas, causando espanto, nojo, repulsa, pessimismo e descrença na maioria ingênua das pessoas. Afirmara que o escândalo haveria de vir, na noção lúcida daquele que afirma que, um dia, todas as ilusões deixarão cair o seu véu e a verdade virá brotar ante os olhos atônitos daqueles que se imaginavam inatingíveis. No entanto, solicita aos que o escutavam que não fossem eles os que causassem os escândalos, já que todo aquele que se conduzisse dessa maneira haveria de estar na rota do desastre, exposto a ele por si próprio. Daí seria preferível privar-se daquilo que põe em risco ou serve de tropeço para a queda dos outros do que manter-se na defesa de tais situações e terminar consumido nas suas dores e frustrações. No entanto, advertia que os escândalos não se verificavam segundo os critérios humanos, sempre recheados de preconceitos e interesses, que hoje condenam aquilo que a conveniência e a cobiça permitem amanhã como coisa natural e vice-versa. Jesus assevera que muitas coisas que os homens perdoam, Deus condena, e que muitas coisas que os homens condenam, Deus releva. Mais ainda, afirma que os puritanos, os moralistas de plantão seriam preteridos, se não fossem sinceros, em face dos pecadores sinceramente arrependidos que, tendo escutado o chamamento mesmo tardiamente, nele acreditaram.  A grande peça teatral que o homem está encenando terá o seu fim e, diante de toda a plateia, serão cerradas as cortinas para reconduzir cada ator à realidade de sua própria nudez moral, motivo pelo qual Jesus advertia para que cada um fosse como uma criança, sem malícia, sem fingimentos, sem ideias preconcebidas, única forma de se protegerem dos efeitos negativos oriundos de uma conduta mentirosa e insincera diante das leis do Universo.

O pecado não está apenas no gesto que prejudica alguém no exterior. O pecado está no sentimento que o alimenta, tenha ele sido exteriorizado ou não, tenha ou não produzido efeitos nocivos a alguém. 

Aquele que fez o exterior também fez o interior e nos conhece perfeita e profundamente. Daí a necessidade de estar puro o coração, como única defesa do ser humano diante do peso de suas culpas e da inferioridade de suas condutas.

A pureza de coração se constrói um pouco a cada dia. Disciplina de alma, disciplina de vontade, disciplina de conduta representam o trilho firme que mantém o trem na direção de seu destino seguro. Qualquer desvio significa novo acidente, nova interrupção e maiores esforços para o recomeço. A pureza que se aconselha no Evangelho é o caminho mais curto entre o coração e a felicidade que se busca. Aos espertalhões que dela fazem mofa e a ridicularizam vivendo à sombra da velha concepção de que o mundo é dos espertos, o tempo se incumbirá de reconduzí-los à lucidez através dos cânceres de todos os tipos, das dores de todos os matizes e das decepções de todas as naturezas”. (Relembrando a Verdade-Espírito Públio-André L. Ruiz, médium)

terça-feira, 30 de outubro de 2012



A Morte Não Existe

“Onde está, ó morte, o teu aguilhão? Onde está, ó inferno, a tua vitória?” (Paulo, I Corintios, 15:55)

Vivemos a vida toda iludidos com nosso corpo, com nossas coisas, sempre lutando para não perdê-las, com medo de sermos roubados, com medo da morte. Há milhares de anos que vivemos do mesmo modo, sendo mal orientados por  religiosos e até por desinteresse nosso mesmo, sempre querendo viver eternamente na carne e, pior, sem nada saber do outro mundo onde iremos morar. Com certeza, ninguém irá morar no cemitério, onde os micróbios desmancham os corpos de carne. Deus, que é Espírito, reservou para seus filhos, Espíritos, algo bem melhor.  Em geral, corremos da morte, achando que ela representa o fim de tudo. Na verdade, o fenômeno que aniquila o corpo físico, ao mesmo tempo libera o nosso Espírito que estava preso, como se estivesse numa gaiola, permitindo-nos retomar a liberdade a que faz jus todo o filho de Deus. A morte é chamada pelo Espiritismo de “desencarnação”, voltando a ter a liberdade de seres espirituais.

Sim, como somos filhos do Criador, não temos nada a temer, pois ele nos empresta tudo para vivermos aqui na Terra por alguns anos, retornando ao Mundo dos Espíritos assim que terminar o nosso prazo de experiências aqui no planeta. Como o Senhor da Vida nos empresta o corpo e tudo que possuímos, temos que devolver algum dia, deixando aqui mesmo tudo o que pertence a este mundo. É importantíssimo que tenhamos esta visão sobre a vida temporária na Terra e a vida eterna, infinita, no Mundo Espiritual. É crucial para nossa saúde que estudemos a Doutrina Espírita, para que obtenhamos as respostas sobre tudo o que diz respeito à reencarnação, sobre a vida no outro mundo e sobre o que Deus espera de nós aqui na Terra, quando, por algum tempo vivemos por aqui. Allan Kardec, em O Livro dos Espíritos, recebeu dos Espíritos Superiores a informação de que Jesus é o modelo e guia da Humanidade. Assim, ao estudarmos o Espiritismo, aprendemos claramente as lições de Jesus, que veio a este planeta para clarear o nosso caminho, ensinando que “toda lei e os profetas estão contidos no amai a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”. Jesus deu a maior demonstração de que a vida continua, sendo morto e retornando com o Corpo Espiritual, isto é, com o Perispírito, materializando-se três dias depois de ter sido morto o seu corpo. Ele viveu materializado entre os seus discípulos por cerca de quarenta dias, provando que a morte não existe. Agora, nestes últimos séculos, mais desenvolvidos, podemos compreender o significado de que "há muitas moradas na Casa de meu Pai" e o diálogo com Nicodemos, quando Ele disse que “é necessário nascer de novo para conhecer o reino de Deus”, ou seja, que a reencarnação é Lei Divina, onde todos os Espíritos têm oportunidade de evoluir na matéria, sempre retornando à Pátria Espiritual.


Falta Educação para a Morte
Temos assistido, diariamente, a matérias na televisão sobre mortes de pessoas, tanto em acidentes como por outros motivos, demonstrando um desconhecimento tão elementar desta questão, que chamou-nos a atenção. As reportagens de uma TV local sobre as mortes de pessoas no acidente da TAM que ocorreu há cinco anos, deixou-nos perplexos. Foram alguns dias de cenas do incêndio que ocorreu no prédio da própria empresa, quando o tal avião chocou-se contra ele, vindo a “morrer” cerca de 199 pessoas. Com estas cenas ao fundo, com frases e depoimentos deprimentes dos parentes, a TV, no horário do almoço, com certeza contribuiu para disseminar uma grande amargura e medo entre os seus milhões de telespectadores. E o caso da boate aquela, que todos os meses eles lembram a tragédia? Já não basta a ignorância da realidade do Espírito, abafada por quase dois mil anos pelas religiões comprometidas com o atraso? Hoje,(2013) tendo a Terceira Revelação completado 156 anos, constatamos que ainda é muito fraca a sua divulgação, ao depararmo-nos com tanto desconhecimento sobre a morte e sobre a continuação da vida no Plano Espiritual, que é o Mundo Originário.

Quem primeiro cuidou da Psicologia da Morte e da Educação  para a morte, em nosso tempo, foi Allan Kardec. Ele realizou uma pesquisa psicológica exemplar sobre o fenômeno da morte. Por anos seguidos falou a respeito com os Espíritos dos mortos. Como explica o Prof. Herculano Pires, “as religiões podiam ter prestado um grande serviço à Humanidade se houvessem colocado o problema da morte em termos de naturalidade. Mas, nascidas da magia e amamentadas pela mitologia, só fizeram complicar as coisas. Como disse Victor Hugo “morrer não é morrer, mas apenas mudar-se". A mudança simples de que falou Victor Hugo transformou-se, nas mãos de clérigos e teólogos, numa passagem dantesca pela selva selvaggia da Divina Comédia.

Muito antes de Augusto Comte, os médicos haviam descoberto que os vivos dependiam sempre e cada vez mais da assistência e do governo dos mortos. De toda essa embrulhada resultou o pavor da morte entre os mortais. O pavor maior da morte provém da ideia de solidão e escuridão. Mas os teólogos acharam que isso era pouco e oficializaram as lendas remotas do Inferno, do Purgatório e do Limbo... De tal maneira se aumentaram os motivos do pavor da morte, que ela chegou a significar desonra e vergonha. Para os judeus, a morte se tornou a própria impureza. Os túmulos e os cemitérios foram considerados impuros. Como podiam eles aceitar um Messias que vinha da Galiléia dos Gentios, onde o Palácio de Herodes fora construído sobre terra de cemitérios? Como aceitar esse Messias que morreu na cruz, vencido pelos romanos impuros, que arrancara Lázaro da sepultura e o fizeram seu companheiro nas lides sagradas do messianismo?

Certa ocasião, o Papa Paulo VI declarou que “existe uma vida após a morte, mas não sabemos como ela é”. Isso quer dizer que a própria Igreja nada sabe da morte, a não ser que morremos. A ideia cristã da morte, sustentada e defendida pelas diversas igrejas, é simplesmente aterradora. Os pecadores ao morrer se vêem diante de um Tribunal Divino que os condena a suplícios eternos. Os criminosos broncos, ignorantes e todo o grosso da espécie humana são atirados nas garras de Satanás, um anjo decaído que só não encarna o mal porque não deve ter carne. Mas com dinheiro e a adoração interesseira a Deus, essas almas podem ser perdoadas, de maneira que só para os pobres não há salvação, mas para os ricos o Céu se abre ao impacto dos tédeuns suntuosos, das missas cantadas e das gordas contribuições para a Igreja. Nunca se viu soberano mais venal e tribunal mais injusto. A depreciação da morte gerou o desabrido comércio dos traficantes do perdão e da indulgência divina. O vil dinheiro das roubalheiras e injustiças terrenas consegue furar a Justiça Divina, de maneira que o desprestígio dos mortos chega a máximo da vergonha. A felicidade eterna depende do recheio dos cofres deixados na Terra.

Diante de tudo isso, o conceito da morte se azinhavra (mancha) nas mãos dos cambistas da simonia(tráfico de coisas sagradas), esvazia-se na descrença total, transforma-se no conceito do nada, que Kant definiu como conceito vazio. O morto apodrece enterrado, perdeu a riqueza da vida, virou pasto de vermes e sua misteriosa salvação depende das condições financeiras da família terrena. O morto é um fraco, um falido e um condenado, inteiramente dependente dos vivos na Terra.

O povo não compreende bem todo esse quadro de misérias em que os teólogos envolveram a morte, mas sente o nojo e o medo da morte, introjetados em sua consciência pela farsa dos poderes divinos que o ameaçam desde o berço ao túmulo e ao além-túmulo. Não é de admirar que os pais e as mães, os parentes dos mortos se apavorem e se desesperem diante do fato irremissível da morte.

Jesus ensinou e provou que a morte se resolve na Páscoa da ressurreição, que ninguém morre, que todos temos o corpo espiritual e vivemos no além-túmulo como vivos mais vivos que os encarnados. Paulo de Tarso proclamou que o corpo espiritual é o corpo da ressurreição, mas a permanente imagem do Cristo crucificado, das procissões absurdas do Senhor Morto, heresia clamorosa, as cerimônias da Via-Sacra e as imagens aterradoras do Inferno Cristão, mais impiedoso e brutal do que os Infernos do Paganismo, marcados a fogo na mente humana através de dois milênios, esmagam e envilecem a alma supersticiosa dos homens.

Não é de admirar que os teólogos atuais, divididos em várias correntes de sofistas cristãos moderníssimos, estejam hoje proclamando, com uma alegria leviana de debilóides, a Morte de Deus e o estabelecimento do Cristianismo Ateu. Para esses teólogos, o Cadáver de Deus foi enterrado pelo Louco de Nietsche, criação fantástica e infeliz do pobre filósofo que morreu louco.

O clero cristão, tanto católico como protestante, tanto do Ocidente como do Oriente, perdeu a capacidade de socorrer e consolar os que se desesperam com a morte de pessoas amadas. Seus instrumentos de consolação perderam a eficiência antiga, que se apoiava no obscurantismo das populações  permanentemente ameaçadas pela Ira de Deus.

A Igreja, Mãe da Sabedoria Infusa, recebida do Céu como graça especial concedida aos eleitos, confessa que nada sabe sobre a vida espiritual e só aconselha aos fiéis as práticas antiquadas das rezas e cerimônias pagas, para que os mortos queridos sejam beneficiados no outro Mundo ao tinir das moedas terrenas. O Messias espantou a chicote os animais do Templo que deviam ser comprados para o sacrifício redentor no altar simoníaco e derrubou as mesas dos cambistas, que trocavam no Templo as moedas gregas e romanas pelas moedas sagradas dos magnatas dispenseiros da misericórdia divina. O episódio esclarecedor foi suplantado na mente popular pelo impacto esmagador das ameaças celestiais contra os descrentes, esses rebeldes demoníacos. Em vão o Cristo ensinou que as  moedas impuras de César só valem na Terra. Há dois mil anos essas moedas impuras vêm sendo aceitas por Deus para o resgate das almas condenadas.    Quem pode, em sã consciência, acreditar hoje em dia numa Justiça Divina que funciona com o mesmo combustível da Justiça Terrena? Os sacerdotes foram treinados a falar com voz empostada, melíflua e fingida, para, à semelhança da voz das antigas sereias, embalar o povo nas ilusões de um amor venal e sem piedade. Voz doce e gestos compassivos não conseguem mais, em nossos dias, do que irritar as pessoas de bom senso. O Cristo Consolador foi traído pelos agentes da misericórdia divina que desceu ao banco  das pechinchas, no comércio impuro das consolações fáceis. Os homens preferem jogar no lixo as suas almas, que Deus e o Diabo disputam não se sabe porquê.

Todos morremos e todos ressuscitamos. Por isso não somos mortais, mas imortais.

Mas, a mais difícil tarefa da Educação para a Morte é precisamente a de quebrar esse condicionamento milenar, integrando os homens numa visão mais realista da vida. Os fatos são de todos os tempos e estão ao alcance de todas as criaturas dotadas de bom senso. Hoje, graças à abertura científica produzida pelo avanço acelerado das Ciências, não se pode admitir que pessoas razoavelmente cultas continuem amarradas, como acontece na própria Parapsicologia, ao sincretismo teológico do Tomismo de Tomás de Aquino. (Prof. Herculano Pires-Educação para a Morte)

"Para libertar-se do temor da morte é mister poder encará-la

sob o seu verdadeiro aspecto, isto é, ter penetrado pelo

pensamento no mundo espiritual, fazendo dele uma ideia

tão exata quanto possível" Allan Kardec



sábado, 20 de outubro de 2012


Não se Pode Servir a Deus e a Mamon

Cap. XVI,  O Evangelho Segundo o Espiritismo, de Allan Kardec

 
                                           Por que não são ricos todos os homens?

Salvação dos Ricos

Ninguém pode servir a dois senhores, porque ou odiará a um e amará a outro, ou se prenderá a um e desprezará o outro. Não podeis servir a    Deus e a Mamon simultaneamente. (Lucas, 16:13)

Mamon é um termo derivado da Bíblia e usado para descrever a riqueza material ou a cobiça, não tendo personificação como divindade. Em hebraico significa, literalmente, dinheiro. Assim, Mamon representa a ganância ou a avareza.

Então, aproximou-se dele um mancebo e disse: - Bom mestre, que devo fazer para adquirir a vida eterna?

Jesus: - Por que me chamais bom? Bom só Deus o é. Se queres entrar na Vida, guarda os mandamentos.

- Que mandamentos?

Jesus: - Não matarás, não cometerás adultério, não furtarás, não darás testemunho falso, honra a teu pai e a tua mãe e ama a teu próximo como a ti mesmo.

- Tenho guardado todos esses mandamentos. Que é que ainda me falta?

Jesus: - Se queres ser perfeito, vai, vende tudo que tens, dá-o aos pobres e terás um tesouro no Céu. Depois, vem e segue-me.

Ouvindo essas palavras o moço se foi tristonho porque era rico.

Jesus: - Digo-vos em verdade que é bem difícil um rico entrar no Reino dos Céus. É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que entrar um rico no Reino dos Céus. (Mateus, 19:16 a 24; Lucas, 18:18 a 25; Marcos, 10:17 a 25)

Esta figura audaciosa pode parecer um pouco forçada, porque não se vê a relação  que existe entre um camelo e uma agulha. Isso resulta de que, em hebreu, a mesma palavra se emprega para designar cabo e camelo. Na tradução se lhe deu esta última acepção; é provável que a primeira era a que estava no pensamento de Jesus; ela é, pelo menos, mais natural.  (Nota de Allan Kardec)

Não acumuleis para vós outros tesouros sobre a Terra, onde a traça e a ferrugem corroem e onde ladrões escavam e roubam. Mas, ajuntai para vós outros tesouros no Céu, onde nem a traça, nem a ferrugem corroem e onde ladrões não escavam nem roubam. Porque, onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração. (Mateus, 6: 19-21)

Preservar-se da Avareza

Então, no meio da turba, um homem lhe disse: Mestre, dize a meu irmão que divida comigo a herança que nos tocou. Jesus lhe disse: - Ó homem! Quem me designou para vos julgar, ou para fazer as vossas partilhas? E acrescentou: - Tende o cuidado de preservar-vos de toda a avareza, porquanto, seja qual for a abundância em que o homem se encontre, sua vida não depende dos bens que ele possua.

Disse-lhes a seguir esta parábola: Havia um homem cujas terras tinham produzido extraordinariamente e que se entretinha a pensar consigo mesmo, assim: Que hei de fazer, pois já não tenho lugar onde possa encerrar tudo o que vou colher? Aqui está, disse, o que farei: demolirei os meus celeiros e construirei outros maiores, onde porei toda a minha colheita e todos os meus bens. E direi à minha alma: Minha alma, tens de reserva muitos bens para longos anos; repousa, come, bebe, goza. Mas, Deus, ao mesmo tempo, disse ao homem: - Que insensato és! Esta noite mesmo tomar-te-ão a alma; para que servirá o que amontoaste?

É o que acontece àquele que acumula tesouros para si próprio e que não é rico diante de Deus. (Lucas, 12:13 a 21)

Explica-nos O Evangelho Segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, que “se a riqueza  houvesse de constituir obstáculo absoluto à salvação dos que a possuem, conforme se poderia inferir de certas palavras de Jesus, interpretadas segundo a letra e não segundo o espírito, Deus, que a concede, teria posto nas mãos de alguns um instrumento de perdição, sem apelação nenhuma, ideia que repugna à razão. É sem dúvida, pelos arrastamentos a que dá causa, pelas tentações que gera e pela fascinação que exerce, a riqueza constitui uma prova muito arriscada, mais perigosa do que a miséria. É o supremo excitante do orgulho, do egoísmo e da vida sensual. É o laço mais forte que prende o homem à Terra e lhe desvia do Céu os pensamentos. Produz tal vertigem que, muitas vezes, aquele que passa da miséria à riqueza esquece de pronto a sua primeira condição, os que com ele a partilharam, os que o ajudaram, e faz-se insensível, egoísta e vão. Mas, do fato de a riqueza tornar difícil a jornada, não se segue que a torne impossível e não possa vir a ser um meio de salvação para o que dela sabe servir-se, como certos venenos podem restituir a saúde se empregados a propósito e com discernimento.

Se a riqueza é causa de muitos males, se exacerba tanto as más paixões, se provoca mesmo tantos crimes, não é a ela que devemos inculpar, mas ao homem, que dela abusou como de todos os dons de Deus. Pelo abuso, ele torna pernicioso o que lhe poderia ser de  maior  utilidade. É a consequência do estado de inferioridade do mundo terrestre. Se a riqueza somente males houvesse de produzir, Deus não a teria posto na Terra. Compete ao homem fazê-la produzir o bem. Se não é um elemento direto de progresso moral, é, sem contestação, poderoso elemento de progresso intelectual.

A desigualdade das riquezas é um dos problemas que inutilmente se procurará resolver, desde que se considere apenas a vida atual. A primeira questão que se apresenta é esta:  Por que não são igualmente ricos todos os homens?  Não o são por uma razão muito simples: por não serem igualmente inteligentes, ativos e laboriosos para adquirir nem sóbrios e previdentes para conservar. É, aliás, ponto matematicamente demonstrado que a riqueza, repartida com igualdade, a cada um daria uma parcela mínima e insuficiente; que, supondo efetuada essa repartição, o equilíbrio em pouco tempo estaria desfeito, pela diversidade dos caracteres e das aptidões; que, supondo-a possível e durável, tendo cada um somente com que viver, o resultado seria o aniquilamento de todos os grandes trabalhos que concorrem para o progresso e para o bem-estar da Humanidade; que, admitido desse ela a cada um o necessário, já não haveria o aguilhão que impele os homens às grandes descobertas e aos empreendimentos úteis. Se Deus a concentra em certos pontos é para que daí se expanda em quantidade suficiente de acordo com as necessidades.”

O Espírito Públio ensina que o Reino de Deus é concedido àqueles que têm a capacidade de escolher as coisas divinas acima daquelas que lhes possibilitem os prazeres e o desfrute das vantagens terrenas. E entre as coisas mais difíceis para os que não entendem a sua destinação espiritual está o desprender-se dos bens que lhe dão uma falsa convicção de poder, de superioridade, de importância.

Os espíritos mesquinhos buscam viver na senda das aparências das quais retiram o prazer efêmero de se sentirem acima  dos demais pelos bens com que se fantasiam, pelas roupas e carros nos quais desfilam sua insignificância, pela imponência suntuosa e extravagante com que a sua miséria pessoal se satisfaz em mostrar-se aos outros, sentindo infantil êxtase.

No entanto, toda a vivência nessa atmosfera de mentiras e indiferenças, demonstra a quantidade de egoísmo que se inoculou no íntimo de cada um a dizer, em seu nome, o tamanho do lodo que se instalou em si próprio. Em face dessa condição, na aproximação fatal do momento de despedir-se de toda a falsa encenação na qual investiu os seus recursos, o despreparado ser humano tenta garantir para si a possibilidade de invadir o paraíso como um clandestino viajante, um ladrão solerte, lançando mão de recursos que pareciam ter-lhe pertencido como forma de barganhar no momento do acerto de contas, na alfândega da Verdade.

Nessa hora que espera por todos, entenderemos o que Jesus pretendeu dizer quando, profundamente, afirmou que não se pode servir a dois senhores.

O apego é o câncer dos materialistas perante a vida espiritual. Fere-os terrivelmente e os consome em dores e decepções por longas décadas, desequilibrando-lhes a mente e lançando-os nos abismos escuros, sob o domínio de trevosos espíritos que, ameaçadores, ironizarão  o seu estado de frágeis caniços vergados ao peso da própria ilusão. Escutarão as acusações daqueles que humilharam, serão objeto de chacota dos que, do plano espiritual inferior, observavam os passos altivos que seus corpos pisavam sobre a Terra, ignorando os demais, orgulhosamente. Que será deles, agora, despidos de tudo aquilo que lhes servia de escudo à personalidade débil de criança crescida? Onde os seus carros, suas contas, seus recursos, seus títulos, seus cargos, seus haveres?

E como no Reino de Deus não existe outro cartório a não ser aquele que reconhece os valores do Bem e da Verdade, os que chegam do mundo tendo desperdiçado as oportunidades de aquisição de tais valores, são miseráveis espectros, relegados ao vazio de si próprios, perdidos nas desilusões  a que foram conduzidos pelo próprio orgulho que não lhes servirá para nada diante das entidades perseguidoras que os aguardam.

Aprender a desprender-se de tudo, todos os dias na Terra, não apenas nos momentos cruciais em que a morte vem avisar que o tempo das aquisições nobres acabou, significa exercitar em si os testemunhos reais de limpeza que podem garantir àquele que renuncia ao apego terreno, o ingresso no Palácio do Espírito.

Escolher a quem servir é sinal de sabedoria quando a escolha recai na abdicação ante as vantagens transitórias para enaltecer-se, apenas, os valores do espírito. Daí, não estar o Céu interditado aos ricos da matéria. Em geral, são os ricos da matéria que não estão interessados em candidatarem-se ao Céu, pagando o preço da passagem para o paraíso por acharem-no muito elevado, já que significa desprendimento e renúncia de tudo aquilo a que eles se apegam.

Assim, na hora do testemunho a que todos seremos chamados, na hora em que a nossa embarcação da vida naufraga, quem se apega ao ouro do mundo afunda, afunda juntamente com o peso daquilo a que se agarrou na hora do naufrágio.

Quem escolhe agarrar-se à palha pobre, ao pedaço humilde de madeira, no momento em que seu barco soçobrar, esse flutuará.


O Mancebo Rico

Interessante o que conta Humberto de Campos sobre alguns detalhes do fato narrado no Evangelho a respeito do “moço rico”. Em reunião no Mundo Espiritual, contou-lhes Simão, sábio israelita, que “Efraim, filho de Bunam, era um chefe prestigioso dos fariseus, considerado cabeça dos hilelitas, que, ao tempo do Senhor, eram francamente mais liberais e mais instruídos que os partidários do Rabi Schammai, fanáticos e formalistas. Judeu profundamente culto, Efraim, aos quarenta de idade, já se fizera autoridade máxima dos herdeiros espirituais de Hilel, o admirável doutor das Sete Regras... Excessivamente rico, dispunha não somente de valiosas terras cultivadas e de formoso palácio residencial em Jericó, onde sustentava largo prestígio, mas também de casas diversas em Jerusalém, vinhedos e campos de cevada, rebanhos e negócios importantes na Síria. Entretanto, não era só isso. Era o depositário dos recursos amoedados de companheiros  numerosos. Todo o fariseu hilelita que se lhe vinculasse à amizade, hipotecava-lhe confiança e, com isso, os próprios bens. Transformara-se-lhe a fortuna pessoal, desse modo, em extensa formação bancária, recolhendo depósitos vultosos e pagando juros compensadores. No centro da organização, cujos interesses financeiros se expandiam, constantes, era ele, embora relativamente moço, um oráculo e um amigo... Devotado leitor de Mischna e apaixonado pelas doutrinas  do antigo orientador que tudo fizera por desentranhar o espírito da letra, na interpretação das Escrituras, Efraim ouviu, com imensa simpatia as notícias do Reino de Deus, de que Jesus se revelava portador. Assinalando o ódio gratuito com que os fariseus rigorosos investiam contra o Mestre, mais se lhe exacerbou o desejo de um contato direto. O Mestre nazareno falava de amor, concórdia, humildade, tolerância. Operava maravilhas. Trazia sinais do Céu, no alívio ao sofrimento humano. Não seria  ele, Jesus, o mensageiro da suprema união? Desde muito jovem, sonhava Efraim com a aliança de todas as crenças do povo de Israel. Mantinha habitualmente conversações pacíficas com saduceus amigos, bem colocados no Sinédrio, buscando a suspirada conciliação, sem resultados. De entendimento seguro com os schammaitas, desistira. Fatigara-se de intrigas e sarcasmos. Diligenciara colher os pontos de vista dos nazarenos e samaritanos, conhecidos por opiniões menos estreitas, ouvira compatrícios mentalmente marcados pelas inovações de credos estrangeiros, quais os que se mostravam em ativa correspondência com a Grécia e com o Egito, mas tudo debalde... Controvérsias entrechocavam-se, quais farpas afogueadas, incentivando perseguições... Demandara retiro deleitoso de essênios, em cuja intimidade repousara, durante alguns dias, anotando, encantado, várias referências, em derredor dos ensinamentos do Cristo; no entanto, mesmo aí, no seio da coletividade consagrada à comunhão de bens, no serviço da agricultura, encontrara antagonistas intransigentes, que não vacilavam no escárnio sobre os profitentes de outras convicções... A pouco e pouco, amadureceu o projeto de ir em pessoa ao encontro de Jesus, o fascinante condutor de multidões, a fim de expor-lhe o magnífico projeto. Reunir, enfim, os descendentes das doze tribos, eliminar para sempre as discussões e estabelecer a solidariedade real... Assim pensando, ao sabê-lo em atividade, além do Jordão, Efraim arrancou-se do lar, tentando surpreendê-lo. Após algum tempo, achou-o entre homens cansados e tristes, e, ao fita-lo, enterneceu-se-lhe o coração... Como que tocado de luz invisível, olhou para si mesmo e envergonhou-se das jóias que trazia, conquanto adotasse, naquela hora, a indumentária que lhe era comumente mais simples. Tomado de funda emotividade, receava agora a almejada entrevista. Sentia-se inibido, pequeno de espírito. Sofreava, a custo, as próprias lágrimas... Sim. Concluía consigo mesmo, dirigir-se-ia ao Mestre das Boas Novas, na feição de aprendiz, ocultaria a própria grandeza individual... Magnetizado, por fim, pelo sereno olhar de Jesus, dirigiu-se até ele e perguntou:

- Bom Mestre, que farei para herdar a vida eterna? Fugindo à lisonja, respondeu o Cristo:

- Por que me chamas bom? Não há bom senão um que é Deus. Mas, se queres entrar na vida eterna, guarda os mandamentos.

- Quais? – tornou Efraim, preocupado. E Jesus enumerou alguns dos antigos preceitos de Moisés:

- Amarás a Deus sobre todas as coisas; não matarás; não cometerás adultério; não furtarás; não pronunciarás falso testemunho; honrarás teus pais; amarás o próximo como a ti mesmo...

Efraim, que não se esquecia da própria condição de príncipe da cultura e da finança farisaicas, ajuntou, sorrindo:

- Tudo isso tenho observado desde a minha juventude.

O Mestre, no entanto, fixou nele os olhos lúcidos, como a desvendar-lhe o âmago da alma, e considerou:

- Algo te falta, ainda... Se queres aperfeiçoar-te, vai, vende tudo o que tens, tudo entregando aos pobres, e terás um tesouro nos Céus... Feito isso, vem e segue-me.

O poderoso dirigente dos fariseus, contudo, ao ouvir essas palavras, recordou subitamente as enormes riquezas que possuía e retirou-se muito triste... Veridiano, um amigo que nos partilhava os estudos, indagou, logo que o relator deu a narrativa por terminada:

- Não será essa a história do mancebo rico, mencionada no Evangelho?

Simão esboçou largo sorriso e informou:

- Sem mais, nem menos...

E assinalando-nos a surpresa, concluiu, sem que nos fosse possível aduzir, depois, qualquer comentário:

- A fusão dos agrupamentos religiosos no mundo é assunto muito velho. É aconselhada com ardor, aqui e ali; entretanto, quando se fala em esvaziar a bolsa, em favor dos necessitados, para que o amor puro garanta a construção do Reino de Deus, nas forças do espírito, quase todos os patronos da apregoada união se afastam muito tristes...” (Contos Desta e Doutra Vida-Humberto de Campos-C. Xavier)

A Parábola do Rico

Na pequena assembleia espiritual, estudávamos a Parábola do Rico. Alguns intelectuais, brilhantes no mundo, inclinavam-se comovidos ante a necessidade de penetrarem a luz dos capítulos simples do Evangelista. Na cátedra das lições costumeiras, a figura de Pedro Richard nos acompanhava com atenção generosa e sincera. O quadro não era muito diferente das circunstâncias em que se poderia realizar sobre a Terra. A esfera espiritual próxima do planeta é uma figura de transição, em que o gosto terrestre tem quase absoluta predominância. O amplo recinto oferecia o aspecto de um parlamento singelo e acolhedor e, como ponto central, aquele velhinho, amigo de Ismael e de Jesus, com os cabelos nevados, parecendo feitos com a luz prateada das mais dolorosas experiências, ensinava o sentido oculto das preciosas lições do Cristo.

- Afinal, exclama um dos meus amigos, existem realmente os grandes usurários e os ricos infelizes do mundo. São os dilapidadores dos bens coletivos, porque a movimentação do dinheiro poderia incentivar o trabalho, atenuando as dificuldades dos mais infortunados.

- Entretanto, atalha um dos presentes, temos as fortunas dos grandes beneméritos da Humanidade. Um Rockefeller, um Carnegie, que estimulavam as grandes iniciativas, em favor do bem público, não serão ricos amados de Deus? E os Henry Ford, que transformam os pântanos em parques industriais, onde milhares de criaturas ganham o pão da vida honestamente, não merecem o respeito amoroso das multidões? A apreciação sobre os ricos da Terra prosseguia animada, quando alguém se lembrou de submeter a Richard o assunto, em sua feição substancial. O generoso velhinho, no entanto, replicou judiciosamente:

- Antes de tudo, só Deus pode julgar em definitivo as suas criaturas; mas, como considero o planeta terrestre uma abençoada escola de dor que conduz à alegria e de trabalho que encaminha para a felicidade com Jesus, devo assinalar que, na carne, não conheço senão Espíritos cheios de débitos pesados, com as mais vastas obrigações, perante a obra de Deus, que é o país infinito das almas. Quem será o Senhor das riquezas senão o próprio Pai que criou o Universo? Onde estão os bancos infalíveis, ou os milionários que possam dispor eternamente dos bens financeiros que lhes são confiados? As expressões cambiais do mundo são convenções que outras convenções modificam. Basta, às vezes, um sopro leve das marés sociais para que todos os quadros da riqueza humana se transformem. Tenho de mim para comigo que, no mundo, o dinheiro a gastar, como a dívida financeira a resgatar são também oportunidades que o Senhor de Todas as Coisas nos oferece, para que sejamos dignos dele. O crédito exige a virtude da ponderação com a bondade esclarecida e o débito reclama a virtude da paciência com o amor ao trabalho.

A estas palavras justas, que nos conduziam a um campo de novas especulações sentimentais, um dos nossos irmãos de esforço, antigo socialista extremado na Terra, entusiasmando-se, talvez em excesso, com as elucidações do generoso mentor, exclamou efusivamente:

- Muito bem! Sempre encontrei no capital um fantasma para a felicidade humana. Pedro Richard endereçou-lhe o olhar, cheio de mansuetude, e explicou com bondade:

- Quem te afirmou que o capital no mundo é um erro? E depois de uma pausa, dando a conhecer que desejava acentuar suas palavras, disse:

- Podemos assinalar a dedo os raríssimos homens da Terra que conseguem trabalhar sem o aguilhão. O capital será esse aguilhão até que as criaturas entendam o divino prazer de servir. Para os mais abastados, ele tem constituído a preocupação bendita da responsabilidade, e para a generalidade dos homens, o estímulo ao trabalho. O capital é um recurso de sofrimento purificador, não somente para os que o possuem, mas para quantos se esforçam pelo obter. É o meio através do qual o amor de Deus opera sobre toda a estruturação da vida material no globo; sem sua influência, as expressões evolutivas do mundo deixariam a desejar, mesmo porque os Espíritos encarnados estariam longe de compreender os valores legítimos da vida, sem a verdadeira concepção da dignidade do trabalho. O nosso amigo quedou-se em meditação. Aqueles esclarecimentos generosos e simples nos surpreendiam profundamente.

O mentor benévolo e sábio continuou as suas elucidações evangélicas. Explicações desconhecidas e inesperadas surgiam de seus lábios, derramando-se em nossos espíritos, como jatos de luz. Eram novas claridades sobre a figura incompreendida e luminosa do Cristo, revelações de sentimentos que nos conduziam ao máximo de admiração. Grande número de literatos desencarnados no Brasil, filiados às mais diversas escolas, escutavam-lhe os conceitos simples e profundos. Foi então que, ao fim dos estudos, e nas derradeiras observações, um velho conhecedor das letras evangélicas adiantou-se para o velhinho bom, interrogando:

- Richard, as tuas explicações são judiciosas e derramam novas claridades em nosso íntimo. Mas, sempre ponderei uma questão de essencial interesse, nessa parábola do Evangelho. Por que motivo o santificador Espírito de Abraão, personificando a Providência Divina junto  de Lázaro redimido, não atendeu às súplicas do Rico desventurado? Não era este também um filho de Deus? Observando os teus esclarecimentos de agora, sinto esta interrogação cada vez mais forte em minha alma, porque, afinal, o homem rico no mundo pode ser, muitas vezes, uma criatura indigente na aspereza das provas. Como esclarecer esse problema que nos induz a supor certa insensibilidade nas almas gloriosas que já se redimiram das vicissitudes da existência material?

O esclarecido comentador da palavra de Jesus replicou com veemência e brandura:

- Insensibilidade nos mensageiros do bem? Esse conceito nasce da nossa deficiência de verdadeira compreensão. Abraão e Lázaro viram nos sofrimentos do Rico a misericórdia inesgotável do Pai Celestial que, dos nossos erros mais profundos, sabe extrair a água amargosa que nos há de curar o coração. Ambos compreenderam que seria contrariar os desígnios divinos levar ao irmão torturado uma água mentirosa que lhe não mataria a sede espiritual. Quanto ao mais, que pedia o Rico ao Espírito generoso de Abraão? Rogava-lhe que Lázaro voltasse ao mundo para dar a seus pais, a sua mulher, a seus filhos e irmãos as verdades de Deus, a fim de que se salvassem. Como não se lembrou de pedir a difusão dessas mesmas verdades, entre todas as criaturas? Por que razão somente pensou nos seus amados pelo sangue, quando todos os homens, nossos irmãos, têm necessidade da paz de Deus, que é a água viva da redenção? A solicitação do Rico é muito semelhante à maioria das súplicas que partem dos caminhos escuros da Terra, filhas do egoísmo ambicioso ou do malfadado espírito de preferência das criaturas, orações que nunca chegam a Deus, por se apagarem no mesmo círculo de sombra e ignorância em que foram geradas pela insensatez dos homens indiferentes!... O nosso amigo religioso recebera também a sua lição. As elucidações evangélicas do dia estavam terminadas.

No recanto silencioso, a que me recolho com as heranças tristes da Terra, intensifiquei as minhas reflexões sobre a grandeza desconhecida do Cristo e, contemplando as perspectivas angustiosas dos quadros sociais da existência terrestre, comecei a meditar, com mais interesse, na profunda Parábola do Rico. (Pontos e Contos-Humberto de Campos-C. Xavier)

terça-feira, 21 de agosto de 2012


                   Bem-aventurados os Pobres de Espírito

                       Cap. VII, O Evangelho Segundo o Espiritismo, de Allan Kardec

       Bem-aventurados os pobres de espírito, pois que deles é o reino dos céus.

Então, a mãe dos filhos de Zebedeu(Salomé) se aproximou dele com seus dois filhos e o adorou, dando a entender que lhe queria pedir alguma coisa. Disse-lhe ele: - Que queres? Manda, disse ela, que estes meus dois filhos(Tiago e João) tenham assento no teu reino, um à tua direita e o outro à tua esquerda. Mas, Jesus lhe respondeu: Não sabes o que pedes; podeis vós ambos beber o cálice que eu vou beber? Eles responderam: Podemos. Jesus lhes replicou: É certo que bebereis o cálice que eu beber; mas, pelo que respeita a vos sentardes à minha direita ou à minha esquerda, não me cabe a mim vo-lo conceder; isso será  para aqueles a quem meu Pai o tem preparado. Ouvindo isso, os dez outros apóstolos se encheram de indignação contra os dois irmãos. Jesus, chamando-os para perto de si, lhes disse: Sabeis que os príncipes das nações as dominam e que os grandes as tratam com império. Assim não deve ser entre vós; ao contrário, aquele que quiser tornar-se o maior, seja vosso servo; e aquele que quiser ser o primeiro entre vós, seja vosso  escravo; do mesmo modo que o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida pela redenção de muitos.
Por essa ocasião, os discípulos se aproximaram de Jesus e lhe perguntaram: Quem é o maior no reino dos  céus? Jesus, chamando a si um menino, o colocou no meio deles e respondeu: - Digo-vos, em verdade que, se não vos converterdes e tornardes quais crianças, não entrareis no reino dos céus. Aquele, portanto, que se humilhar e se tornar pequeno como esta criança será o maior no reino dos céus e aquele que recebe em meu nome a uma criança, tal como acabo de dizer, é a mim mesmo que recebe.
Disse, Jesus, estas palavras: - Graças te dou, meu Pai, Senhor do céu e da Terra, por haveres ocultado estas coisas aos doutos e aos prudentes e por as teres revelado aos simples e aos pequenos.  (Mateus, 5:3; 18: 1-5; 20: 20-28; 11:25)

Segundo Allan Kardec, “por pobres de espírito Jesus não entende os baldos de inteligência, mas os humildes, tanto que diz ser para estes o reino dos céus e não para os orgulhosos. Os homens de saber e de espírito, no entender  do mundo, formam geralmente tão alto conceito de si próprios e da sua superioridade, que consideram as coisas divinas como indignas de lhes merecer a atenção. Concentrando sobre si mesmos os seus olhares, eles não os podem elevar até Deus. Essa tendência de se acreditarem superiores a tudo, muito amiúde os leva a negar até mesmo a Divindade. Ou, se condescendem em admiti-la, contestam-lhe um dos mais belos atributos: a ação providencial sobre as coisas deste mundo, persuadidos de que eles são suficientes para bem governá-lo. Tomando a inteligência que possuem para medida da inteligência universal, e julgando-se aptos a tudo compreender, não podem crer na possibilidade do que não compreendem. Consideram sem apelação as sentenças que proferem. Se se recusam a admitir o mundo invisível e uma potência extra-humana, não é que isso lhes esteja fora do alcance, é que o orgulho se lhes revolta à ideia de uma coisa acima da qual não possam colocar-se e que os faria descer do pedestal onde se contemplam. Daí  o só terem olhos de mofa para tudo o que não pertence ao mundo visível e tangível. Eles se atribuem espírito e saber em tão grande cópia, que não podem crer em coisas, segundo pensam, boas apenas para gente simples, tendo por pobres de espírito os que as tomam a sério. Entretanto, digam o que disserem, forçoso lhes será entrar, como os outros, nesse mundo invisível de que escarnecem. É lá que os olhos se lhes abrirão e eles reconhecerão o erro em que caíram. Deus, porém, que é justo, não pode receber da mesma forma aquele que lhe desconheceu a majestade e outro que humildemente se lhe submeteu às leis, nem os aquinhoar em partes iguais”.

O grão de mostarda, o trigo, o carvalho, o pólen das flores, todos são importantes na Terra. O grão de areia se anula ante outro para construir a praia imensa que recebe as ondas do mar carinhosamente. Tudo é importante diante de meu Pai...
Entre os homens, o maior é sempre aquele que se esquece de si mesmo, tornando-se o melhor servidor, aquele que não se cansa de ajudar...
Aquele que, dentre vós, desejar ser o maior, o mais importante, o mais amado, torne-se o melhor servidor, o mais atento amigo, sempre vigilante para ajudar e desculpar, porque esse, sim, fará falta, será notado quando ausente, se tornará alicerce para a construção do edifício do Bem.(Até o Fim dos Tempos-Espírito Amélia Rodrigues, médium Divaldo Franco)
Por que Jesus se vale de uma criança como modelo para alcançar o Reino de Deus? Primeiramente está a ideia de humildade, de pequenez. Não será com arrogância e com violência que se ganhará o Reino de Deus, mas com doçura  e desejo de servir. O conquistador do Reino de Deus é aquele que serve antes de ser servido. É aquele que, como Jesus, é capaz de lavar os pés empoeirados do homem comum. É preciso ser puro de coração como uma criança para alcançar o Reino de Deus. A criança, enquanto não está contaminada com a maneira hipócrita de viver da maioria dos adultos, fala sempre com muita sinceridade, porque ainda não aprendeu a mentir.

Conta-se que dois espertalhões, desejando ganhar dinheiro às custas de um rei, foram até o palácio e propuseram ao monarca o seguinte:  Faremos para o senhor uma roupa mágica, tecida com fios divinos, tirados do tear dos deuses. Essa roupa, entretanto, só poderá ser vista por pessoas honestas, que não corrompem nem são corrompidas, pessoas verdadeiras e leais à Vossa Majestade. Assim, o senhor saberá quem lhe é fiel e quem não é. O rei gostou da ideia e deu prazo de 5 dias para que a roupa fantástica fosse feita. No segundo dia, o rei que estava curioso sobre a roupa, mandou um de seus ministros inspecionar a oficina. O ministro, que não era honesto, contou ao rei que a roupa estava ficando muito bonita. A farsa continuou até que a roupa, pronta, foi levada ao rei que, também não a vendo, acreditou que ele próprio não era tão honesto quanto imaginara. Então, o rei decidiu fazer um grande teste: sairia pelas ruas com a sua roupa nova, conhecendo, assim, o caráter de seus súditos. A comitiva, com banda, deixou o castelo e marchou por toda a cidade e todos que a viam diziam para o rei ouvir: “Que bela roupa!” “Nunca vossa majestade esteve tão bem vestido!” Ao passar por uma praça, entretanto, uma criança gritou muito admirada:  “O rei está nu”.

A criança é sincera, franca e honesta até que aprende com  os adultos a ser mentirosa, desonesta, insincera. E Jesus quer de nós essa pureza da criança, esta franqueza natural, sem hipocrisia.

Há, entretanto, uma vaidade que se veste com a capa da humildade para enganar as pessoas menos perspicazes. Conta-se que na cidade de Atenas o filósofo Glauco adorava passar por humilde, usando sempre um velho manto. Certo dia, encontrou-se com Sócrates que, ao vê-lo, comentou: “Oh! Glauco, vejo a tua vaidade me espreitando pelos buracos de teu manto”. Existem pessoas que, como Glauco, vestem-se mal, tentando demonstrar humildade. Os humildes raramente se dão conta do seu modo de ser. 

Albert Einstein foi convidado pela rainha Juliana para um almoço e ele não compareceu. Bem depois do horário, um homem insistia em falar com a rainha. Ela perguntou-lhe o que havia ocorrido e por que chegara atrasado. Ele disse que o motivo era que viera de ônibus. Então ela disse que mandara uma comitiva, inclusive com banda. - E o senhor não viu? – Vi. Mas era para mim? (Evangelho e Qualidade de Vida-José Carlos Leal)
Existe muita confusão entre humildade e pobreza. Por não entender esta frase de Jesus, em tempos passados, muitos cristãos se desfizeram de seus bens materiais, chegando ao absurdo da miserabilidade, isto é, se tornaram mendigos, imaginando que iriam direto para o Céu. Sendo o dinheiro neutro, podendo ser usado para o Bem e para o Mal, não significa que quem não o tem seja melhor do que o tem em quantidade.

A humildade não tem nada a ver com o dinheiro ou situação econômica. No momento em que entendermos que tudo pertence a Deus, então, estaremos em condições de perceber e ingressar no Reino de Deus. E Jesus já nos ensinou que o Reino está dentro de nós, quando estabelecermos plena sintonia com a fonte da Vida.
A simplicidade, então, é fundamental para o ingresso no Reino. Somente o homem humilde tem liberdade total.
A pessoa humilde naturalmente tem aspirações. Contudo, ela não se apega.
Aquele que ultrapassa os limites, querendo sempre mais, torna-se escravo. As aspirações que deveriam ser parte de nossas vidas, tornam-se a finalidade dela. Quando tem sucesso nos negócios, chega ao ponto de não ser mais nem dono de si, tal o envolvimento com a administração de tanta coisa. Outros tornam-se doentes porque não casaram, ou porque não têm filhos, ou não se curam de certos males, ou não tem sucesso na vida. (A Voz do Monte-Richard Simonetti)

Diz-nos o Espírito Públio que o homem já demonstrou que tem força e coragem para trucidar o semelhante, para diminuí-lo em busca do próprio sucesso, para desprezar-lhe as lágrimas, a fome, o desencanto e o desespero como se fossem ruídos de alguma turbulência ao longe, no horizonte. Precisará demonstrar agora, que possui coragem para reverenciar os chamados perdedores da vida. Para elevar-lhes a condição humana ao patamar da dignidade mínima garantida a todas as criaturas sobre a Terra e que compete aos que se consideram maiores ajudar, proteger e promover.
Aprender a ser pequeno é a tarefa que se impõe aos que desejam ser grandes sempre e que já perceberam que todas as suas glórias não foram capazes de trazer a paz ou a felicidade.
Pequenez que não significa miséria material, conduta exterior de humilhação, pobreza moral ou qualquer manifestação externa de debilidade, mas uma consciência que toda grandeza transitória no mundo decorre diretamente da permissão de Deus para que se estabeleça no caminho de alguém por algum tempo.
Sobretudo um comportamento interior de respeito a todos os que a vida não pode enaltecer com o sucesso. Uma mão estendida aos que estão caídos pelos fracassos a que foram expostos pelas contingências da jornada evolutiva ou por suas próprias deficiências.
O gesto que ergue para educar o caído, que ampara o fraco com o respeito fraterno que não humilha, que oferece ajuda sem impor o peso da vergonha sobre o que já se entregou à derrota.
Sentir a misteriosa inspiração para ser pequeno diante dos que o mundo despreza por não terem sido os que ganharam as disputas na qual todos estão engalfinhados cegamente é começar a se aproximar da verdadeira ventura da alma.
Devolver alegria e esperança à multidão dos falidos da emoção, aos esfarrapados morais, aos vitimados pelas tragédias sociais será tarefa que permitirá que cada uma dessas pequenas e mirradas plantinhas se voltem, novamente, para o Sol e, crescendo o quanto possam, com a sua ajuda, ofereçam algumas pequenas sementes na hora da colheita.
Entender o que significa servir é a única vitória consistente para a alma arrogante e ambiciosa, que perceberá que nenhuma ambição pessoal lhe permitirá a ventura sentida pelo menor gesto de altruísmo sincero em favor dos derrotados.
Não é pelo parâmetro mundano que as leis do Universo regem seus filhos.
Não é pelas glórias luminosas de alguns instantes fugazes que as criaturas são avaliadas no céu das grandezas celestes.
E, se  é verdade que o homem pode produzir luzes fulgurantes com pólvora e tecnologia, observamos que um vaga-lume produz, sozinho, mais luz em si e por si mesmo do que ele, o poderoso ser humano.
Aprender a servir, eis a maneira de produzir luz e felicidade próprias, como Jesus ensinou. (Jesus no Teu Caminho-Espírito Públio, médium André L. Ruiz)