Páginas

sexta-feira, 20 de julho de 2012


Falta Educação para a Morte

Temos assistido, diariamente, a matérias na televisão sobre mortes de pessoas, tanto em acidentes como por outros motivos, demonstrando um desconhecimento tão elementar desta questão, que chamou-nos a atenção. As reportagens de uma TV local sobre as mortes de pessoas no acidente da TAM, que ocorreu há cinco anos, deixou-nos perplexos. Foram alguns dias de cenas do incêndio que ocorreu no prédio da própria empresa, quando o tal avião chocou-se contra ele, vindo a morrer cerca de 199 pessoas. Com estas cenas ao fundo, com frases de efeito e depoimentos deprimentes dos parentes, a TV, no horário do almoço, com certeza contribuiu para disseminar uma grande amargura e medo entre os seus milhões de teleespectadores.
Quem primeiro cuidou da Psicologia da Morte e da Educação  para a morte, em nosso tempo, foi Allan Kardec. Ele realizou uma pesquisa psicológica exemplar sobre o fenômeno da morte. Por anos seguidos falou a respeito com os Espíritos dos mortos. Como explica o Prof. Herculano Pires, “as religiões podiam ter prestado um grande serviço à Humanidade se houvessem colocado o problema da morte em termos de naturalidade. Mas, nascidas da magia e amamentadas pela mitologia, só fizeram complicar as coisas. Como disse Victor Hugo “morrer não é morrer, mas apenas mudar-se. A mudança simples de que falou Victor Hugo transformou-se, nas mãos de clérigos e teólogos, numa passagem dantesca pela selva selvaggia da Divina Comédia.
Muito antes de Augusto Comte, os médicos haviam descoberto que os vivos dependiam sempre e cada vez mais da assistência e do governo dos mortos. De toda essa embrulhada resultou o pavor da morte entre os mortais. O pavor maior da morte provém da ideia de solidão e escuridão. Mas os teólogos acharam que isso era pouco e oficializaram as lendas remotas do Inferno, do Purgatório e do Limbo... De tal maneira se aumentaram os motivos do pavor da morte, que ela chegou a significar desonra e vergonha. Para os judeus, a morte se tornou a própria impureza. Os túmulos e os cemitérios foram considerados impuros. Como podiam eles aceitar um Messias que vinha da Galiléia dos Gentios, onde o Palácio de Herodes fora construído sobre terra de cemitérios? Como aceitar esse Messias que morreu na cruz, vencido pelos romanos impuros, que arrancara Lázaro da sepultura e o fizeram seu companheiro nas lides sagradas do messianismo?
Certa ocasião, o Papa Paulo VI declarou que “existe uma vida após a morte, mas não sabemos como ela é”. Isso quer dizer que a própria Igreja nada sabe da morte, a não ser que morremos. A ideia cristã da morte, sustentada e defendida pelas diversas igrejas, é simplesmente aterradora. Os pecadores ao morrer se vêem diante de um Tribunal Divino que os condena a suplícios eternos. Os criminosos broncos, ignorantes e todo o grosso da espécie humana são atirados nas garras de Satanás, um anjo decaído que só não encarna o mal porque não deve ter carne. Mas com dinheiro e a adoração interesseira a Deus, essas almas podem ser perdoadas, de maneira que só para os pobres não salvação, mas para os ricos o Céu se abre ao impacto dos tédeuns suntuosos, das missas cantadas e das gordas contribuições para a Igreja. Nunca se viu soberano mais venal e tribunal mais injusto. A depreciação da morte gerou o desabrido comércio dos traficantes do perdão e da indulgência divina. O vil dinheiro das roubalheiras e injustiças terrenas consegue furar a Justiça Divina, de maneira que o desprestígio dos mortos chega a máximo da vergonha. A felicidade eterna depende do recheio dos cofres deixados na Terra.
Diante de tudo isso, o conceito da morte se azinhavra(mancha) nas mãos dos cambistas da simonia(venda dos bens espirituais), esvazia-se na descrença total, transforma-se no conceito do nada, que Kant definiu como conceito vazio. O morto apodrece enterrado, perdeu a riqueza da vida, virou pasto de vermes e sua misteriosa salvação depende das condições financeiras da família terrena. O morto é um fraco, um falido e um condenado, inteiramente dependente dos vivos na Terra.
O povo não compreende bem todo esse quadro de misérias em que os teólogos envolveram a morte, mas sente o nojo e o medo da morte, introjetados em sua consciência pela farsa dos poderes divinos que o ameaçam desde o berço ao túmulo e ao além-túmulo. Não é de admirar que os pais e as mães, os parentes dos mortos se apavorem e se desesperem diante do fato irremissível da morte.
Jesus ensinou e provou que a morte se resolve na Páscoa da ressurreição, que ninguém morre, que todos temos o corpo espiritual e vivemos no além-túmulo como vivos mais vivos que os encarnados. Paulo de Tarso proclamou que o corpo espiritual é o corpo da ressurreição, mas a permanente imagem do Cristo crucificado, das procissões absurdas do Senhor Morto, heresia clamorosa, as cerimônias da Via-Sacra  e as imagens aterradoras do Inferno Cristão, mais impiedoso e brutal do que os Infernos do Paganismo, marcados a fogo na mente humana através de dois milênios, esmagam e envilecem a alma supersticiosa dos homens.
Não é de admirar que os teólogos atuais, divididos em várias correntes de sofistas cristãos moderníssimos, estejam hoje proclamando, com uma alegria leviana de debilóides, a Morte de Deus e o estabelecimento do Cristianismo Ateu. Para esses teólogos, o Cadáver de Deus foi enterrado pelo Louco de Nietsche, criação fantástica e infeliz do pobre filósofo que morreu louco.
O clero cristão, tanto católico como protestante, tanto do Ocidente como do Oriente, perdeu a capacidade de socorrer e consolar os que se desesperam com a morte de pessoas amadas. Seus instrumentos de consolação perderam a eficiência antiga, que se apoiava no obscurantismo das populações  permanentemente ameaçadas pela Ira de Deus.
Igreja, Mãe da Sabedoria Infusa, recebida do Céu como graça especial concedida aos eleitos, confessa que nada sabe sobre a vida espiritual e só aconselha aos fiéis as práticas antiquadas das rezas e cerimônias pagas, para que os mortos queridos sejam beneficiados no outro Mundo ao tinir das moedas terrenas. O Messias espantou a chicote os animais do Templo que deviam ser comprados para o sacrifício redentor no altar simoníaco e derrubou as mesas dos cambistas, que trocavam no Templo as moedas gregas e romanas pelas moedas sagradas dos magnatas dispenseiros da misericórdia divina. O episódio esclarecedor foi suplantado na mente popular pelo impacto esmagador das ameaças celestiais contra os descrentes, esses rebeldes demoníacos. Em vão o Cristo ensinou que as  moedas impuras de César só valem na Terra. Há dois mil anos essas moedas impuras vêm sendo aceitas por Deus para o resgate das almas condenadas.    Quem pode, em sã consciência, acreditar hoje em dia numa Justiça Divina que funciona com o mesmo combustível da Justiça Terrena? Os sacerdotes foram treinados a falar com voz empostada, melíflua e fingida, para, à semelhança da voz das antigas sereias, embalar o povo nas ilusões de um amor venal e sem piedade. Voz doce e gestos compassivos não conseguem mais, em nossos dias, do que irritar as pessoas de bom senso. O Cristo Consolador foi traído pelos agentes da misericórdia divina que desceu ao banco  das pechinchas, no comércio impuro das consolações fáceis. Os homens preferem jogar no lixo as suas almas, que Deus e o Diabo disputam não se sabe porquê.

Todos morremos e todos ressuscitamos. Por isso não somos mortais, mas imortais.

Mas, a mais difícil tarefa da Educação para a Morte é precisamente a de quebrar esse condicionamento milenar, integrando os homens numa visão mais realista da vida. Os fatos são de todos os tempos e estão ao alcance de todas as criaturas dotadas de bom senso. Hoje, graças à abertura científica produzida pelo avanço acelerado das Ciências, não se pode admitir que pessoas razoavelmente cultas continuem amarradas, como acontece na própria Parapsicologia, ao sincretismo teológico do Tomismo de Tomás de Aquino”. (Educação para a Morte, J. Herculano Pires)


Nenhum comentário:

Postar um comentário