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segunda-feira, 6 de agosto de 2012


Bem-aventurados os Aflitos

Cap. V, O Evangelho Segundo o Espiritismo, de Allan Kardec

Bem-aventurados os que choram, pois que serão consolados. Bem-aventurados os famintos e os sequiosos de justiça, pois que serão saciados. Bem-aventurados os que sofrem perseguição pela justiça, pois que é deles o reino dos céus. (Mateus, 5:4, 6-10)

Bem-aventurados vós, que sois pobres, porque vosso é o reino dos céus. Bem-aventurados vós, que agora tendes fome, porque sereis saciados. Ditosos sois, vós que agora chorais, porque rireis.(Lucas, 6:20-21)

Ensina Allan Kardec que “somente na vida futura podem efetivar-se as  compensações que Jesus promete aos aflitos da Terra. Sem a certeza do futuro, estas máximas seriam um contra-senso; mais ainda: seriam um engodo. Mesmo com esta certeza, dificilmente se compreende a conveniência de sofrer para ser feliz. Mas, então pergunta-se: por que sofrem uns mais do que outros? Por que nascem uns na miséria e outros na opulência, sem coisa alguma haverem feito que justifique essas posições? Por que uns nada conseguem ao passo que a outros tudo parece sorrir? Todavia, o que ainda menos se compreende é que os bens e os males sejam tão desigualmente repartidos entre o vício e a virtude; e que os homens virtuosos sofram, ao lado dos maus que prosperam. A fé no futuro pode consolar e infundir paciência, mas não explica essas anomalias, que parecem desmentir a justiça de Deus. Entretanto, desde que admita a existência de Deus, ninguém o pode conceber sem o infinito das perfeições. Ele necessariamente tem todo o poder, toda a justiça, toda a bondade, sem o que não seria Deus. Se é soberanamente bom e justo, não pode agir com capricho, nem com parcialidade. Logo, as vicissitudes da vida derivam de uma causa e, pois, que Deus é justo, justa há de ser essa causa. Isso é o que cada um deve bem compenetrar-se. Por meio dos ensinos de Jesus, Deus pôs os homens na direção dessa causa, e hoje, julgando-os suficientemente maduros para compreendê-la, lhes revela completamente a aludida causa, por meio do Espiritismo, isto é, pela palavra dos Espíritos.

Kardec ensina que os problemas da vida originam-se de duas fontes: uns têm causa nesta vida e outros fora desta vida.

Causas Atuais das Aflições

Quantos homens caem por sua própria culpa! Quantos são vítimas de sua imprevidência, de seu orgulho e de sua ambição! Quantos se arruínam por falta de ordem, de perseverança, pelo mau proceder, ou por não terem sabido limitar seus desejos! Quantas uniões desgraçadas, porque resultaram de um cálculo de interesse ou de vaidade e nas quais o coração não tomou parte alguma! Quantas dissensões e funestas disputas se teriam evitado com um pouco de moderação e menos suscetibilidade! Quantas doenças e enfermidades decorrem da intemperança e dos excessos de todo gênero!”

Ensina o Prof. Raul Teixeira que, “no campo das aflições da criatura humana, podemos identificar causas que são criadas agora. Muita gente chora, se lamenta. Há muitos que se desesperam diante dos problemas, dos tormentos, das dificuldades que estão lhes assoberbando a vida na atualidade, nesses dias. Quase nunca essas mesmas pessoas se apercebem de que esses sofrimentos, essas aflições, esses problemas pelos quais estão passando foram criados agora, nesta mesma vida, nos tempos da nossa trajetória terrestre. Uma das causas mais pungentes de aflições é o temperamento. Meu Deus! Quantas são as pessoas que têm temperamentos fortíssimos. São ditas pessoas de pavios curtos. Há outras que nem pavios têm, explodem por qualquer coisa. Então, são pessoas mal vistas, não são queridas, onde chegam os outros saem. E isso é motivo de tormento, de aflição. Mas, por causa delas mesmas. Existem outras que afirmam não levar desaforos para casa e, por qualquer coisa, estouram. Outras afirmam que são muito boas, mas que ninguém pode pisar-lhes os pés, outras dizem... outras dizem tantas coisas para justificar o injustificável.

Eu dou um boi para não entrar na briga; dou uma boiada para não sair da briga. São pessoas temperamentais, estranhas criaturas. Vão gerando em torno de si medo em algumas, raiva em outras, indiferença em várias. Ao mesmo tempo, geram reações similares de outros que também tenham pavios curtos, não tenham pavios ou que também são muito boas enquanto não tenham os pés pisados. Afinal de contas, vivemos na Terra em busca da felicidade, em busca da nossa integração com Deus e com Suas Leis. Não importa se não se é religioso, se não se frequenta instituição religiosa, se não se participa de circuitos religiosos, Deus é o Pai do Universo. Não nos importa como Ele seja chamado. Ele é o Pai do Universo, é o Grande Criador. E o nosso compromisso, nesta vida, é nos ajustar às Suas Leis. Então há muitos sofrimentos, muitas aflições geradas por causa do nosso temperamento. Pessoas explosivas, pessoas que se fecham, ao invés de conversar, de discutir, de dizer o que é que lhes está incomodando. Elas se fecham e agem com raiva, com mágoa, com ódio, sem dizer uma palavra. Quando se lhes perguntam: Há algum problema? - elas dizem: Não, está tudo bem. Mas neste está tudo bem, vai a marca da sua indisposição interior.

Também há problemas, aflições nesta atualidade, que são pendentes dos vícios que adquirimos. Quantos vícios! Uma criatura que aprendeu a fumar desde novinha, dali há poucos anos estará com asma, com bronquite, com enfisema pulmonar e quem sabe com câncer. Estará transpirando mau odor, o tabaco na circulação sanguínea.

Quantas são as enfermidades, amputações, degenerescências orgânicas por causa do tabagismo. Não é Lei de Deus ter que fumar, não foi uma imposição da Divindade ter que fumar, mas há liberdade, o livre arbítrio. Nesta mesma vida, o indivíduo começou a usar essa droga, o tabaco e foi adoecendo o corpo, foi mutilando o corpo.

Então, é natural que nós identifiquemos nesses indivíduos todos, aqueles que estão provocando aflições para suas vidas, nesta atualidade, nesta mesma existência.

Há aqueles que usam alcoólicos e vão na mesma direção. Bebem porque bebem. Afirmam mil coisas: bebem por alegria, bebem por tristeza, bebem porque está quente, bebem porque o tempo está frio.

Bebem porque bebem e vão gerando desgastes orgânicos, problemas neurológicos, dificuldades sociais que começam na família, atormentada com uma pessoa alcoólatra ou alcoólica, como se diz atualmente.  Começamos a verificar que há muitas aflições cujas causas estão na nossa vida presente, fazem parte da nossa atualidade e cabe a nós ter precaução e evitar gradativamente.

Existem situações que, verdadeiramente, são dispensáveis. Há coisas que não se precisa viver aqui, agora, não precisa sofrer nesta existência.

Recordo-me de um episódio que acompanhei de perto, porque se tratava de uma pessoa de minhas relações, que demorou muito a se casar. Era uma jovem, professora e demorou a se casar porque queria encontrar o par ideal. Casou-se com um homem mais maduro que ela mas de um temperamento muito explosivo, daqueles intolerantes. Casaram-se, viveram felizes alguns meses. Ela engravidou, nasceu-lhe o bebê e quando o bebê contava três meses de idade, era fim de ano e o casal resolveu ir a um comércio para comprar um refrigerador de maior tamanho, para atender à família que estava começando a crescer. Saíram, fizeram as compras e voltaram para casa. Ele dirigindo o carro e ela, ao lado, com a criança nos braços. Numa determinada rua da cidade, um taxista fechou-lhe o carro, por inadvertência desses profissionais que trabalham de qualquer jeito. Fechou-lhe o carro e ele, naquela aflição, naquela agonia, imaginou que o taxista tivesse feito de propósito. Acelerou seu veículo, foi atrás do taxista, cercou-o e abriu a porta do carro. Era para discutir, era para brigar, mas o taxista imaginou que ele fosse ser agredido, tomou da arma no porta-luvas do táxi e descarregou sobre o pai de família. Matou na hora e a esposa teve que criar o filho a sós, sofrer a dificuldade da viuvez e de todos os comprometimentos decorrentes disso. O outro homem, na prisão. E a vida seguiu seu curso.

Não haveria nenhuma necessidade dessa criança ser criada órfã, dessa mulher ficar viúva, desse taxista ser preso, se não fosse o temperamento e uma atitude infeliz de uma pessoa tensa, de temperamento tenso.

São as causas atuais das aflições. Quantas são as pessoas que vão limpar a janela do prédio, do edifício, sem qualquer instrumento de segurança?

Dependuram-se nas janelas e caem. Não foi Deus que fez, não estava na hora. São suicídios indiretos.

Quantas são as criaturas que bebem alcoólicos e apanham o carro para dirigir. Elas podem se matar, podem matar os outros, podem provocar tragédias inomináveis na sociedade. Aflições geradas, agora, pela inadvertência, pela incúria, pela má vontade, pelo temperamento rebelde de alguém que entendeu que o álcool em si não teria o mesmo efeito que tem sobre todas as demais pessoas. Então começamos a perceber que há muitas aflições que geramos agora.

Aqueles pais que não educam bem aos seus filhos e, desde cedo, vão lhes ensinando a devolver violência com violência, a brigar nas ruas, a não levar desaforos para casa, a tirar proveito de tudo, a passar por cima de todo mundo para conquistar seus objetivos em nome da esperteza, logo mais, esses pais estarão sofrendo tanto, porque a polícia virá à sua porta dizer que eles mataram índios, incendiaram índios pensando que eram mendigos, bateram em empregadas domésticas, supondo que fossem meretrizes, como se mendigos e meretrizes devessem apanhar da classe média ou de quem quer que seja. A educação que receberam. E tanto é verdade que são esses mesmos pais, que já deflagraram esse processo horrível de deseducação ou de má educação, que vão em busca de profissionais corruptos para defender seus filhinhos dos crimes que eles próprios ensinaram.

É tão estranha a criatura humana quando se distancia das Leis de Deus, quando não presta atenção no mundo que é, por si mesmo, de provas e de expiações, que nos cabe amaciar, vivendo melhor. Como é que me aproveitarei de qualquer que seja a situação de minha vida para piorar a minha condição?

É preciso ter muito cuidado para que não geremos nestes dias de nossa vida aflições que teremos que sofrer nestes dias de nossa vida.(Prof. Raul Teixeira)

Causas Anteriores das Aflições

E Kardec continua: “Mas, se há males nesta vida cuja causa primária é o homem, outros há também aos quais, pelo menos na aparência, ele é completamente estranho e que parecem atingi-lo como por fatalidade. Tal, por exemplo, a perda de entes queridos e a dos que são o amparo da família. Tais, ainda, os acidentes que nenhuma previsão poderia impedir; os reveses da fortuna, que frustram todas as precauções aconselhadas pela prudência; os flagelos naturais, as enfermidades de nascença, sobretudo as que tiram a tantos infelizes os meios de ganhar a vida pelo trabalho: as deformidades, a idiotia, o cretinismo, etc. Os que nascem nessas condições, certamente nada hão feito na existência atual para merecer, sem compensação, tão triste sorte, que não podiam evitar, que são impotentes para mudar por si mesmos e que os põe à mercê da comiseração pública. Por que, pois, seres tão desgraçados, enquanto, ao lado deles, sob o mesmo teto, na mesma família, outros são favorecidos de todos os modos?

Todavia, em virtude do axioma segundo o qual todo o efeito tem uma causa, tais misérias são efeitos que hão de ter uma causa e, desde que se admita um Deus justo, essa causa também há de ser justa. Ora, o efeito precedendo sempre a causa, se esta não se encontra  na vida atual, há de ser anterior a essa vida, isto é, há de estar numa existência precedente.”

E o Prof. Raul Teixeira prossegue: “Há muitas coisas na existência que nos causam dúvidas curiosas.

Há muita coisa que se não sabe de onde é que vem, porque acontece, como é que ocorre.

Basta olharmos as nossas crianças. Desde novinhas, demonstram coisas curiosas para nós, nos dizem coisas que nunca lhes ensinamos, apresentam situações que nunca esperamos.

Crianças que nascem microcéfalas, com o crânio reduzido; macrocéfalas, com o crânio ampliado; crianças que nascem sem cérebro, anencéfalas; crianças que nascem surdas, mudas, que ficam paralíticas, sem nenhuma razão exterior palpável.

As mães fizeram pré-natais notáveis, sérios, com bons médicos e os filhos nascem com lesões irreversíveis.

Encontramos situações para as quais não vemos explicações imediatas na vida que temos.

Por que é que nascem crianças em Nova York, em São Paulo, em Tóquio, que não lhes falta nada e nascem outras em Serra Leoa, na Libéria, nos confins do Nordeste brasileiro às quais falta tudo?

Qual é a visão que temos dessas questões, se considerarmos as Leis de Deus? Por que é que Deus faz isto?

Por que nascem crianças com todas as possibilidades de se desenvolver e nascem outras para as quais falta tudo? As dificuldades homéricas para que se desenvolvam...

Como é que nascem crianças ricas, poderosas e outras miseráveis, famélicas? Como explicar essas coisas?

Essas crianças não fizeram nada para merecer isso.

A voz popular diz que são verdadeiros anjinhos e uma mãe retém, nos seus braços, um anjinho marcado por doenças incuráveis ou por doenças gravíssimas tendo ela feito tudo o que era preciso fazer durante a gestação, tendo ela todo o amor do mundo para dar ao seu neném. O que é que acontece?

Ficamos pensando nesses problemas para os quais não achamos explicações agora, nesta atualidade do mundo, mas nem por isso menos aturdentes.

São situações grotescas mesmo. Como é que uma criança é violada? É violentada e morta? Como se justifica isto?

Somente na fereza do adulto que fez? Como é que podemos justificar isso, se consideramos as Leis de Deus Leis de perfeição?

Isso faz com que muita gente estabeleça não crer mais em Deus porque seria impossível admitirmos esse Deus justo, amoroso, bom, paternal, Pai de toda a Humanidade, admitindo a unicidade das vidas. Chegamos na Terra uma vez só, vivemos na Terra uma vez só. Se for assim, a vida não merece ser vivida.

Essa miséria toda que se espalha no mundo, ao lado dessa riqueza toda que o mundo guarda. Deus, de fato, não poderia existir.

O que acontece é que, às vezes, nos falta esse olhar para compreendermos que não estamos na Terra por primeira vez, nem pela última vez.

Adotar a visão milenar reencarnacionista, não aquela que, por exemplo, têm os nossos irmãos indianos de que um familiar pode nascer num rato, num bicho qualquer, como havia na Grécia a ideia da metempsicose; seres humanos que podiam nascer em corpos de plantas ou de bichos. Não, não é por aí.

Admitimos, sim, que as almas voltam para habitar novos corpos, para viver de novo na Terra, mas em corpos humanos e, nesses corpos humanos é que elas terão que dar conta do que desarranjaram no seu passado, quando viveram em outros corpos humanos.



Diante dessas situações, temos que admitir que não existe uma única existência na Terra, não existe uma única vida na Terra.

Lembramos do texto do Evangelista João, no seu capítulo terceiro, onde há uma conversa entre Jesus e o Rabi Nicodemos quando Ele diz que: Aquele que não nascer de novo, não verá o Reino dos Céus.

Nicodemos pergunta ao Mestre Jesus: Como pode um homem, sendo velho, voltar ao ventre de sua mãe para tornar a nascer?

Nicodemos tinha entendido, não tinha admitido que pudesse acontecer isso. Como é que um homem velho...?

E Jesus Cristo redargue:

Aquele que não nascer da água e do Espírito, não verá o Reino dos Céus.

Naturalmente que, ao longo das idades, já no século XX, os cientistas demonstraram que um corpo físico é um corpo de água. Demonstraram que a vida orgânica nasceu no seio das águas, ainda nos tempos remotos da Terra.

E nascer do Espírito é essa renovação que o corpo físico nos permite viver.

Estamos num corpo físico para aprender a iluminar o Espírito, para trabalhar essa questão da alma.

Então aqueles equívocos, aqueles erros que perpetramos em outras vidas, em outras existências, não se apagaram.

Mas não foi outra pessoa que viveu esse passado?

Sim, foi outra pessoa, mas o mesmo indivíduo.

A pessoa, a personalidade é a máscara; Persona, do latim, quer dizer máscara, cara.

Em cada existência, mudamos de face, mudamos de cara, mudamos de persona, mudamos a personalidade, mas é o mesmo indivíduo mudando de caras, mudando de máscaras. Quando trocamos de roupa, não deixamos de ser quem somos.

Então, os erros que cometemos no passado voltam conosco. Estamos de roupa nova, mas a alma é a mesma e temos que dar conta disto.

Os acertos que tenhamos feito no passado também retornam conosco.

É por isso que já merecemos uma sociedade com progressos, já temos luz elétrica, já temos vacinas, já temos remédios, já temos uma moradia boa.

Isso tudo corresponde ao bem que já espalhamos na Terra, ao bem que já fizemos na Terra, às realidades luminosas que inauguramos na Terra.

No entanto, os erros cometidos, os enganos perpetrados, Cristo disse: Só saireis daí depois de pagardes o último quadrante, a última moeda.

É importantíssimo perceber que a Terra é, ao mesmo tempo, uma escola, também um hospital, também uma cadeia, dependendo daquilo que estejamos fazendo aqui.

Quem precisa continuar aprendizados que não foram concluídos no seu passado e está na Terra, a Terra se lhe mostra uma escola.

Quem não foi punido pela justiça no passado, foi esperto e escapou da lei, para esses, quando retornam, a Terra é a mão da justiça, é um presídio, é um cárcere.

Para aqueles que criaram patologias nas vivências desorganizadas do seu passado, os que se encheram de drogas, de excessos e infelicitaram a vida e saíram do corpo mais cedo, voltam à Terra e, para esses, a Terra é um hospital.

De qualquer forma, seja uma escola, um hospital, uma oficina de trabalhos, seja um presídio, a Terra é o nosso campo abençoado de oportunidades.

Tudo quanto não temos explicações na atualidade, essas explicações estão no nosso passado, nas coisas que fizemos, positivas ou negativas.

Todos estamos na Terra nascidos de novo, como lembrou Jesus.

Quem não nascer de novo, não progride, não avança, não melhora, não tem tempo para isto.

Seria terrível em uma única existência definirmos tudo. Quem vive cem anos na Terra não aprende tudo. Imaginemos quem nasce e morre, quem morre jovem não aprendeu tudo, nem no mundo do intelecto, nem no campo da moral, da ética.

É por isso que precisamos voltar à essa escola, voltar a esse cárcere, voltar a esse hospital, voltar a esse campo de aprendizados, que é a Terra.

Todas as questões para as quais não encontremos respostas hoje, essas respostas estão no ontem nosso, pessoal ou no ontem da Humanidade.” (Prof. Raul Teixeira)

 O Sofrimento Alheio

Belarmino Cintra, sentado no quinto banco do bonde, estava magoado, desesperado. Por 11 anos aguardara a promoção no trabalho correto na repartição onde estava há 20 anos, mas outro colega, que ele julgava sem condições, ocupara a vaga. Então, escrevera uma carta ao chefe ameaçando-o de inquérito escandaloso, e o chefe chamara-o a gabinete para entendimento pessoal. Não suportaria qualquer advertência. Estava revoltado e armara-se caso o chefe lhe desconsiderasse.

O bonde para por alguns minutos e, no banco da frente, uma senhora míope levanta um livro espírita que Belarmino lê a seguinte frase: - Tenha  paciência. Fitando o sofrimento alheio, aprendemos a encontrar a felicidade que é nossa. Belarmino sentiu uma ducha fria. Nisso sobe um homem pesado e senta-se no banco próximo e comenta:

- Vida penosa! Não aguento mais!

- É, meu amigo, disse outro homem que estava ao lado, cada qual neste mundo tem sua quota de aflição...

- Vida boa é de médico, disse o gordo ao passarem  em frente a um consultório médico com uma fila enorme. Os clientes lhe trazem a sopa à boca.

- O senhor está enganado. Eu sou médico. Estamos presos ao sofrimento humano. Cada enfermo é um problema... E desabafa: - Vida boa deve ser do caixeiro viajante...

- Caixeiro viajante? Não diga isso. Sou viajante comercial há 15 anos e só encontro humilhações  por toda parte, longe da família...

Belarmino prestava atenção na conversa, quando uma senhora subiu no bonde com uma criança doente, com uma faixa sanguinolenta nos olhos.

E Belarmino perguntou-lhe: - O que foi?

- Meu filhinho perdeu os olhos com a explosão de uma bomba.

Ele procura consolá-la.

Pouco depois, ele desce do bonde, transformado, e entra no gabinete da chefia. O diretor  recebe-o, evidentemente irritado. Mas, Belarmino fala humilde:

- Doutor, antes de tudo, quero pedir-lhe desculpas por minha carta violenta e ofensiva... Eu não tinha razão!

O chefe sorriu, como quem se livrara de um desastre iminente, e falou alegre:

- Oh! Graças a Deus, você entendeu por fim... As injunções políticas são pedras no caminho... Somos companheiros, Belarmino. Não perca a esperança. A promoção virá breve... Mas Belarmino sorri também, e roga:

- Doutor,  peço-lhe! Não se preocupe comigo. Eu estava perturbado.

E despediu-se tranquilo, para voltar ao trabalho.

Mas, no dia seguinte, o chefe procurou-o, com excelentes informes, e Belarmino contou-lhe a história viva da frase que lera de escantilhão. (Almas em Desfile-Espírito Hilário Silva, FCX e WV)

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